Presidente do TJPE não vê nada demais em desvio de recursos do Fundeb para pagamento de empresa acusada de fraudes e na falta de merenda nas escolas e determina retorno do prefeito de Catende ao cargo
Pela segunda vez, prefeito de Catende retorna ao cargo por decisão do presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco Adalberto Oliveira
Nova decisão do presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Adalberto Oliveira, determinou que o prefeito de Catende retorne ao cargo do qual fora afastado a pedido do Ministério Público de Pernambuco, pelo Juiz Ricardo Guimarães, da Vara Única de Catende. Segundo desembargador, que pela segunda vez devolve a prefeitura a Josibias Cavalcante, o afastamento do prefeito "não faz o menor sentido" e "foi sem causa jurídica razoável".
Confira as razões para o afastamento do prefeito e tire suas próprias conclusões:
A pedido do MPPE, Justiça afasta Prefeito de Catende. Saiba que acusações pesam contra o gestor
"Diante do exposto, ACOLHO o pedido do Ministério Público e DETERMINO o afastamento temporário do Sr. Prefeito Municipal de Catende, Josibias Darcy de Castro Cavalcanti, pelo prazo de 180 dias (prazo no qual a demanda será sentenciada), sem prejuízo de sua remuneração, devendo assumir o cargo o vice-prefeito eleito", Determinou o juiz na decisão.
De acordo com a petição do Promotor de Catende, acatada pela Justiça para afastar novamente Josibias, que voltara ao cargo beneficiado por uma decisão do presidente do TJPE, "foi paga a Gratificação de Produtividade de forma indevida, a diversos servidores, no período compreendido entre janeiro de 2017 a dezembro de 2018, bem como o pagamento indevido da referida gratificação para servidores contratados por tempo determinado – ao arrepio da lei, pois só efetivos têm direto à verba."
Além disso, "alguns servidores receberam, de forma ininterrupta, a gratificação de horas extras, entre janeiro a dezembro de 2018, o que soa estranho, tendo em vista que se trata de vantagem eventual condicionada à efetiva prestação do serviço por período superior ao regular." Segundo a decisão de afastamento, “a auditoria detectou, em relação ao ex-servidor Roberto Augusto Lira Moura, filho do prefeito, que além da transgressão da Súmula n° 13 do STF, houve pagamento indevido de restos trabalhistas. Isso porque, apesar de ter sido exonerado em 02/10/2017, fls. 1154, através da Portaria GP 140/2018, as fichas financeiras revelam que o mesmo percebeu vencimentos em dezembro de 2017, janeiro e fevereiro de 2018. Portanto, pode-se afirmar que, no período em que percebeu vencimentos, era ocupante, de fato, do respectivo cargo, o que se revela flagrante desrespeito com o Ministério Público do Estado. Fato esse que enseja a devolução do que foi pago indevidamente no valor de R$ 15.250,00. (fls.1161/1162) A auditoria também detectou nas folhas de pagamento dos meses de outubro de 2018 a janeiro de 2019, que foi pago, ao supracitado ex-servidor, o montante de R$ 21.249,90 = 4 x 5.287,47, referente a restos trabalhistas, (fls. 1179 a 1181).”
"O município desrespeitou o limite de 54% com o pagamento de pessoal, imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal", afirma o magistrado, complementando “que a situação recorrente de descumprimento da LRF, supra relatada, notadamente, nos anos de 2017 e 2018, guarda relação direta com as irregularidades apontadas no presente relatório de auditoria, mais especificamente nos Achados A1.1 (gastos excessivos com pessoal do FUNDEB 40%); A.2.1 (pagamentos indevidos de gratificações de produtividade); A2.2 (pagamento de hora-extra sem comprovação); e OA.1 (contratação de servidores temporários sem a realização de processo seletivo).”
COMPRA DE COMBUSTÍVEIS
"Outra constatação (mais grave que as anteriores, diga-se) versa sobre a licitação para a compra de combustíveis no Posto Buranhém LTDA. O relatório aponta que “a prefeitura de Catende formalizou os processos licitatórios, relacionados na tabela 01, cujo montante adjudicado importou, em R$ 3.991.764,73, no período de junho de 2016 a dezembro 2018, tendo como vencedor e único”, destaca a decisão.
Estranheza. Segundo o magistrado, "causa estranheza o tamanho da quantia gasta com a compra de combustíveis. Não se desconhece que a prefeitura tem que abastecer uma infinidade de veículos, como carros oficiais que servem às secretarias, ônibus escolares, etc. Entretanto, fazendo uma operação matemática elementar e considerando que o valor do litro de gasolina na região da Mata Sul, em 2018, girava em torno de R$ 4,50 (no máximo), bem como que o município gastou R$1.697.884,06 (um milhão seiscentos e noventa e sete mil oitocentos e oitenta e quatro reais e seis centavos) no mesmo ano, percebe-se que foram adquiridos aproximadamente, exorbitantes 377.307 (trezentos e setenta e sete mil trezentos e sete) litros de combustível. Considerando que em média, um carro roda 10 quilômetros com um litro e que veículos a diesel chegam e rodar muito mais que isso (e que esse combustível é consideravelmente mais barato que a gasolina e usualmente empregado em ônibus escolares e caminhonetes), chega-se a conclusão de que os veículos da prefeitura, juntos, rodaram quase 4 milhões de quilômetros em apenas um ano – o que não é verossímil. Como parâmetro, relembre-se que uma volta ao mundo corresponde a cerca de 40 mil quilômetros, informação que evidencia o descalabro do valor gasto com combustível.
Em segundo lugar, a auditoria do TCE constou que ocorreu uma dispensa indevida de licitação (beneficiando o aludido posto), já em 2016, e que o contrato daí originado foi indevidamente prorrogado até janeiro de 2017. Além disso, apurou-se que a situação da inscrição do Posto, junto à JUCEPE, nessa época, era – constatações que geram violações à disciplina da Lei 8.666/93. cancelada Some-se a isso, o fato de que, curiosamente, o único licitante nos anos de 2017 e 2018 foi o Posto Buranhém, que mais uma vez venceu os certames. Destaque-se que a cotação de preços foi realizada com postos localizados em Palmares, quando em tese, poderia fazê-la utilizando as informações disponíveis no sítio eletrônico da ANP."
Ainda de acordo com a decisão, "a prefeitura de Catende prorrogou, através do segundo termo de aditivo, o prazo do contrato de 2018, até o dia 29 de março de 2019, tendo sido pago, apenas até março deste ano, o montante de R$ 541.989,18 (quinhentos e quarenta e um mil novecentos e oitenta e nova reais e dezoito centavos). O valor total pago ao posto (entre 2016 e 2019), com fortes indícios de irregularidades, alcança a cifra milionária de R$ 4.677.108,18 (quatro milhões seiscentos e setenta e sete mil cento e oito reais e dezoito centavos)."
FALTA DE MERENDA
De acordo com a decisão, o TCE, detectou falta de merenda nas escolas municipais de Catende, nos "anos de 2017, 2018 e 2019. No que toca ao ano de 2018, o relatório constatou que no referido exercício, a 'provável falta de fornecimento de merenda, foi ainda mais grave, sendo despendido, para aquisição de gêneros alimentícios para a merenda escolar, apenas o montante de 593.712,15, conforme relatórios de empenhos, fls. 2368 a 2375. Esse valor representa 59,40% do que foi, efetivamente, aplicado em 2017, como apontado anteriormente, que, relembre-se, foi inferior ao estimado naquele ano.'”
DESVIOS DE RECURSOS DO FUNDEB PARA PAGAMENTO DE EMPRESA INVESTIGADA POR FRAUDES EM LICITAÇÕES
Para o magistrado, a questão do uso do dinheiro dos precatórios do FUNDEB seria a irregularidade mais grave apontada pelo MPPE para justificar o afastamento de Josibias Cavalcanti: " Inicialmente, deve ficar claro que a referida verba só poderia ter sido utilizada em ações de manutenção e desenvolvimento do ensino – sendo vedado até mesmo o seu uso para o pagamento de profissionais do magistério (porque se trata de precatório do FUNDEB, e não de recurso regular do referido fundo)." De acordo com o MPPE, o "TCE constatou que foi creditado, em favor do município, na Conta 71.020-2, no Banco do Brasil, no dia 12/07/2017, o montante de R$ 13.681.835,08 (treze milhões seiscentos e oitenta e um mil oitocentos e trinta e cinco reais e oito centavos), e que desse total, prefeitura de Catende realizou diversas transferências para a Conta 35.231-4, também no Banco do Brasil, no montante de R$4.408.273,42 (quatro milhões quatrocentos e oito mil duzentos e setenta e três reais e quarenta e dois centavos). Desse último montante, foi transferido um total de R$ 2.058.514,04 para os Fundos Municipais de Saúde (FMS) e de Ação Social (FMAS) – o que obviamente não é permitido, tendo o dinheiro vinculação específica – bem como efetuados pagamentos à sociedade empresária Eliúde da Silva- ME, no valor de R$ 1.477.639,37, referentes a serviço de coleta de lixo."
O magistrado relembra que "essa última pessoa jurídica, a ELIÚDE, é ré no presente processo (tendo sido acusada de participar de fraudes em licitações), tendo sido alvo de medidas cautelares impostas por este juízo anteriormente. Ademais, ela figura em diversas outras improbidades que tramitam em outras comarcas da Mata Sul pernambucana – tendo sido alvo, ainda, de outra fase da Operação Gênesis, deflagrada na Comarca de Quipapá, já em 2019. Logo, além de empregar de forma irregular verba federal vinculada à educação, gastou-se o dinheiro para contratar com sociedade empresária envolvida em diversas ações de improbidade."
Além desses fatos graves, afirma o juiz, "outros citados no relatório são a não realização de concursos para a seleção simplificada de servidores e o pagamento irregular de estabilidade financeira a alguns servidores."
LEIA A ÍNTEGRA DA DECISÃO:
Processo nº 0000556-60.2017.8.17.2490
AUTOR: PROMOTOR DE JUSTIÇA DE CATENDE
RÉU: JOSIBIAS DARCY DE CASTRO CAVALCANTI, S. A. SOUZA CONSTRUTORA LTDA - EPP, ALVARO ANTONIO TEIXEIRA DE SOUZA, MENEZES LOCACOES CONSTRUCOES E SERVICOS E CIA LTDA - EPP, GABRIELA MONTEIRO MENEZES, JOSE DE AZEVEDO MENEZES FILHO, ELIUDE PESSOA DA SILVA EIRELI - ME, ELIUDE PESSOA DA SILVA, VINICIUS SANTOS DE OLIVEIRA, ABZAEL CORREIA DE BARROS, WYLLIAMS SEVERINO RAMOS LOPES DO NASCIMENTO, SILVANA LUCIA LINS DE OLIVEIRA CORREIA DE MELO, FRANCISCO LUAN ALMEIDA DE SIQUEIRA SOUZA, FRANCISCO LUAN ALMEIDA DE S. SOUZA - ME, CLODOMIR AZEVEDO DE ARAUJO, C A DE ARAUJO CONST CIVIL - ME, JOVELINA QUITERIA SILVA DE LIMA, ALEXANDRE MAURO LIRA MOURA CAVALCANTI, FERREIRA & PINTO SERVICOS E TRANSPORTE LTDA - EPP, RENNAN PEREIRA RABELO, LUCICLEIDE GONCALVES DE QUEIROZ, FATIMA CRISTINA CORREIA DOMINGOS
DECISÃO
Trata-se de novo pedido de afastamento do Sr. Prefeito Municipal de Catende, formulado pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco, com base em fatos reputados graves, descritos na petição de ID nº 48873695.
Diversos documentos foram anexados, merecendo destaque o relatório, confeccionado pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco. O referido documento aponta as mais várias irregularidades graves, que teriam sido cometidas pela gestão do atual prefeito. Segundo o documento, elas se iniciam no ano de 2016 e perduram até a presente data.
Como é de conhecimento público, o atual prefeito já foi cautelarmente afastado por este juízo. A decisão foi objeto de vários recursos, mas posteriormente acabou sendo reformada pelo Excelentíssimo Senhor Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, e o gestor foi reintegrado ao cargo.
Ocorre que o presente requerimento se assenta em fatos novos – no sentido de que só foram conhecidos agora – mas que têm a ver com os inicialmente narrados na inicial. Por isso, o requerimento não pode deixar de ser apreciado pelo Poder Judiciário.
DOS FATOS NOVOS APRESENTADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO
Analisando o relatório que instrui a petição, percebe-se que a atual administração nunca parou de realizar condutas ímprobas e ilegais, mesmo após o afastamento do gestor, em abril de 2018.
Iniciemos pela consulta ao item 2.1.2, que demonstra que foi paga a Gratificação de Produtividade de forma indevida, a diversos servidores, no período compreendido entre janeiro de 2017 a dezembro de 2018, bem como o pagamento indevido da referida gratificação para servidores contratados por tempo determinado – ao arrepio da lei, pois só efetivos têm direto à verba. Sobre o ponto, conclui o relatório que o Sr. Prefeito autorizou a “elaboração da folha de pagamento de servidores públicos municipais, com remuneração incluída a gratificação de produtividade, superior ao permissivo legal, quando deveria ter observado os limites previstos na Lei Municipal Nº 1158/1992 e no Decreto Municipal Nº 087/2001, resultou em gastos indevidos no período de janeiro de 2017 a julho de 2018”.
Em outro ponto, pontua o relatório que alguns servidores receberam, de forma ininterrupta, a gratificação de horas extras, entre janeiro a dezembro de 2018, o que soa estranho, tendo em vista que se trata de vantagem eventual condicionada à efetiva prestação do serviço por período superior ao regular.
Além disso, “a auditoria detectou, em relação ao ex-servidor Roberto Augusto Lira Moura, filho do prefeito, que além da transgressão da Súmula n° 13 do STF, houve pagamento indevido de restos trabalhistas. Isso porque, apesar de ter sido exonerado em 02/10/2017, fls. 1154, através da Portaria GP 140/2018, as fichas financeiras revelam que o mesmo percebeu vencimentos em dezembro de 2017, janeiro e fevereiro de 2018. Portanto, pode-se afirmar que, no período em que percebeu vencimentos, era ocupante, de fato, do respectivo cargo, o que se revela flagrante desrespeito com o Ministério Público do Estado. Fato esse que enseja a devolução do que foi pago indevidamente no valor de R$ 15.250,00. (fls.1161/1162) A auditoria também detectou nas folhas de pagamento dos meses de outubro de 2018 a janeiro de 2019, que foi pago, ao supracitado ex-servidor, o montante de R$ 21.249,90 = 4 x 5.287,47, referente a restos trabalhistas, (fls. 1179 a 1181).”
Também é apontado que o município desrespeitou o limite de 54% com o pagamento de pessoal, imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal e “que a situação recorrente de descumprimento da LRF, supra relatada, notadamente, nos anos de 2017 e 2018, guarda relação direta com as irregularidades apontadas no presente relatório de auditoria, mais especificamente nos Achados A1.1 (gastos excessivos com pessoal do FUNDEB 40%); A.2.1 (pagamentos indevidos de gratificações de produtividade); A2.2 (pagamento de hora-extra sem comprovação); e OA.1 (contratação de servidores temporários sem a realização de processo seletivo).” pagamento indevido de horas extras e de gratificações indevidas, levaram a um outra ilicitude, que foi o desrespeito à LRF.
Outra constatação (mais grave que as anteriores, diga-se) versa sobre a licitação para a compra de combustíveis no Posto Buranhém LTDA. O relatório aponta que “a prefeitura de Catende formalizou os processos licitatórios, relacionados na tabela 01, cujo montante adjudicado importou, em R$ 3.991.764,73, no período de junho de 2016 a dezembro 2018, tendo como vencedor e único .”participante, em todos os certames, o supracitado posto de combustíveis. Sobre a compra de combustíveis junto ao citado Posto, alguns temperamentos devem ser realizados. Em primeiro lugar, causa estranheza o tamanho da quantia gasta com a compra de combustíveis. Não se desconhece que a prefeitura tem que abastecer uma infinidade de veículos, como carros oficiais que servem às secretarias, ônibus escolares, etc. Entretanto, fazendo uma operação matemática elementar e considerando que o valor do litro de gasolina na região da Mata Sul, em 2018, girava em torno de R$ 4,50 (no máximo), bem como que o município gastou R$1.697.884,06 (um milhão seiscentos e noventa e sete mil oitocentos e oitenta e quatro reais e seis centavos) no mesmo ano, percebe-se que foram adquiridos aproximadamente, exorbitantes 377.307 (trezentos e setenta e sete mil trezentos e sete) litros de combustível. Considerando que em média, um carro roda 10 quilômetros com um litro e que veículos a diesel chegam e rodar muito mais que isso (e que esse combustível é consideravelmente mais barato que a gasolina e usualmente empregado em ônibus escolares e caminhonetes), chega-se a conclusão de que os veículos da prefeitura, juntos, rodaram quase 4 milhões de quilômetros em apenas um ano – o que não é verossímil. Como parâmetro, relembre-se que uma volta ao mundo corresponde a cerca de 40 mil quilômetros, informação que evidencia o descalabro do valor gasto com combustível.
Em segundo lugar, a auditoria do TCE constou que ocorreu uma dispensa indevida de licitação (beneficiando o aludido posto), já em 2016, e que o contrato daí originado foi indevidamente prorrogado até janeiro de 2017. Além disso, apurou-se que a situação da inscrição do Posto, junto à JUCEPE, nessa época, era – constatações que geram violações à disciplina da Lei 8.666/93. cancelada Some-se a isso, o fato de que, curiosamente, o único licitante nos anos de 2017 e 2018 foi o Posto Buranhém, que mais uma vez venceu os certames. Destaque-se que a cotação de preços foi realizada com postos localizados em Palmares, quando em tese, poderia fazê-la utilizando as informações disponíveis no sítio eletrônico da ANP.
Finalizando este ponto, merece ser ressaltado que a prefeitura de Catende prorrogou, através do segundo termo de aditivo, o prazo do contrato de 2018, até o dia 29 de março de 2019, tendo sido pago, apenas até março deste ano, o montante de R$ 541.989,18 (quinhentos e quarenta e um mil novecentos e oitenta e nova reais e dezoito centavos). O valor total pago ao posto (entre 2016 e 2019), com fortes indícios de irregularidades, alcança a cifra milionária de R$ 4.677.108,18 (quatro milhões seiscentos e setenta e sete mil cento e oito reais e dezoito centavos).
Outro ponto de extrema relevância e gravidade levantado pelo TCE, é a falta de merenda nas escolas municipais de Catende, nos anos de 2017, 2018 e 2019. No que toca ao ano de 2018, o relatório constatou que no referido exercício, a “provável falta de fornecimento de merenda, foi ainda mais grave, sendo despendido, para aquisição de gêneros alimentícios para a merenda escolar, apenas o montante de 593.712,15, conforme relatórios de empenhos, fls. 2368 a 2375. Esse valor representa 59,40% do que foi, efetivamente, aplicado em 2017, como apontado anteriormente, que, relembre-se, foi inferior ao estimado naquele ano.”
Outra situação de gravidade extrema (talvez a mais grave de todas) merece destaque especial: a questão do uso do dinheiro dos precatórios do FUNDEB. Inicialmente, deve ficar claro que a referida verba só poderia ter sido utilizada em ações de manutenção e desenvolvimento do ensino – sendo vedado até mesmo o seu uso para o pagamento de profissionais do magistério (porque se trata de precatório do FUNDEB, e não de recurso regular do referido fundo).
O TCE constatou que foi creditado, em favor do município, na Conta 71.020-2, no Banco do Brasil, no dia 12/07/2017, o montante de R$ 13.681.835,08 (treze milhões seiscentos e oitenta e um mil oitocentos e trinta e cinco reais e oito centavos), e que desse total, prefeitura de Catende realizou diversas transferências para a Conta 35.231-4, também no Banco do Brasil, no montante de R$4.408.273,42 (quatro milhões quatrocentos e oito mil duzentos e setenta e três reais e quarenta e dois centavos).
Desse último montante, foi transferido um total de R$ 2.058.514,04 para os Fundos Municipais de Saúde (FMS) e de Ação Social (FMAS) – o que obviamente não é permitido, tendo o dinheiro vinculação específica – bem como efetuados pagamentos à sociedade empresária Eliúde da Silva- ME, no valor de R$ 1.477.639,37, referentes a serviço de coleta de lixo.
Relembre-se que essa última pessoa jurídica, a ELIÚDE, é ré no presente processo (tendo sido acusada de participar de fraudes em licitações), tendo sido alvo de medidas cautelares impostas por este juízo anteriormente. Ademais, ela figura em diversas outras improbidades que tramitam em outras comarcas da Mata Sul pernambucana – tendo sido alvo, ainda, de outra fase da Operação Gênesis, deflagrada na Comarca de Quipapá, já em 2019. Logo, além de empregar de forma irregular verba federal vinculada à educação, gastou-se o dinheiro para contratar com sociedade empresária envolvida em diversas ações de improbidade.
Além desses fatos graves, outros citados no relatório são a não realização de concursos para a seleção simplificada de servidores e o pagamento irregular de estabilidade financeira a alguns servidores.
DA SOLUÇÃO JURÍDICA
Ao fim e ao cabo, fica patente que durante toda a gestão da atual administração, atos ímprobos, como o desvio de recursos públicos e a malversação de verbas, têm sido cometidos. Nem mesmo o primeiro afastamento do prefeito teve o condão de intimidar a atual gestão, que continua agindo, de forma avassaladora, desconforme aos Princípios Constitucionais da Administração Pública.
O que também fica claro, é que a única forma eficaz para deter os atos ímprobos descritos na petição do Ministério Público e no relatório do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, é o novo afastamento do gestor, conforme o requerido, e que sem a adoção de tal medida, danos irreversíveis poderão ocorrer.
Sobre o tema, de plano, ressalte-se que não se desconhece que é majoritária a jurisprudência do STJ, no sentido de que o parágrafo único do art. 20 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) só permite o afastamento cautelar do gestor público, quando ficar demonstrado que ele está agindo no sentido de impedir ou dificultar a produção de provas para a ação de Improbidade.
Alguns temperamentos devem ser realizados. Como se sabe, o processo é um instrumento para o exercício do direito de ação. A tutela cautelar, a seu turno, é também um instrumento, mas que visa garantir o resultado útil do processo, buscando neutralizar os efeitos deletérios do tempo.
Para isso, essa técnica contém duas acepções distintas. A primeira é no sentido de assegurar-se a eficácia de uma providência cognitiva, ou seja, de buscar-se a proteção do acervo probatório. É que de nada vale o feito seguir seu curso, se a instrução ficou prejudicada porque as provas foram dilapidadas, ou porque não se pôde produzi-las por obra da interferência do investigado ou de terceiros Essa mirada foi a adotada pelo legislador, na redação do p.u. do art. 20 da LIA. .
A segunda acepção de tutela cautelar é a de assegurar-se a eficácia da tutela executiva, ou seja, de proteger-se o bem da vida do processo, pois ele é inútil se não garantir ao vencedor da contenda o bem objetivado por ocasião do ajuizamento do feito – seja porque ele se perdeu durante o curso da demanda, seja porque os efeitos da conduta ilícita se tornaram irreversíveis.
O STJ, ao afirmar que o afastamento do gestor pode operar-se apenas para garantir a produção de provas, debruçou-se exclusivamente sobre o primeiro olhar (assegurar a eficácia de uma providência cognitiva), prestigiando a literalidade da redação do p.u. do art. 20 da LIA.
Ocorre que essa interpretação olvida-se completamente dos objetivos da Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa, que visa, além de vários outros fins, evitar o dano ao erário e aos princípios da administração pública, insculpidos na Lei e principalmente no art. 37 da Carta Magna. caput Saliente-se, ademais, que a própria Lei de Improbidade encontra fundamento de validade na Carta Magna, merecendo ser interpretada de forma sistemática.
Na hipótese dos autos, o administrador age em clara afronta ao princípio da moralidade administrativa e nem mesmo o primeiro afastamento do cargo – que envolveu uma grande operação do GAECO – e toda repercussão que gerou o caso, o demoveu de continuar com as condutas deletérias, conforme amplamente demonstrado supra.
Nessa toada, é desconforme ao princípio da moralidade administrativa (e, portanto, inconstitucional), insculpido no art. 37 da Carta Magna, deixar de afastar rapidamente o prefeito, quando tantos elementos concretos apontam afrontas a mandamentos constitucionais tão sensíveis e a realização de atos ímprobos tão graves. É ainda mais desconforme ao princípio da moralidade, deixar de fazê-lo, quando existem tantas evidências concretas que deixam claro que a medida é a única realmente eficaz para impedir o agravamento da sangria nos cofres públicos.
Na verdade, se a medida não for tomada imediatamente, os danos ao patrimônio do município logo serão irreversíveis, inviabilizando a disponibilização de serviços públicos aos munícipes. Basta analisar as cifras que envolvem as ações descritas no petitório, para chegar-se a essa conclusão. Catende é um município pequeno (com parca arrecadação em virtude da decadência da cultura álcool-açucareira), que sobrevive basicamente de repasses realizados por entes maiores (Estado e União). Nesse cenário, nenhum centavo pode ser desprezado e desvio algum pode ser admitido, sob pena de penúria orçamentária.
No caso dos autos, os valores são milionários, gerando danos graves e risco de irreversibilidade da situação de crise econômico-financeira ora experimentada. Apenas para ilustrar, é de conhecimento público que o município passou por severas dificuldades para pagar o salário dos servidores de algumas secretarias no início do ano de 2019 (vários servidores ficaram meses sem receber), fato que denuncia a situação calamitosa das contas do município.
Deve-se, pois, analisar a questão sobre o pedido de afastamento sob outro ângulo, invertendo-se o ponto de observação. A lente que deve orientar o exame do intérprete é sempre a da Carta Magna. Parte-se dela para analisar os diplomas que encontram lá seu fundamento, e não ao contrário.
Por isso, cumpre conferir ao parágrafo único do art. 20 da LIA, interpretação conforme a Constituição, para afirmar que ainda que a medida aparentemente não se faça necessária para a instrução processual, poderá ser levada a efeito, através do Poder Geral de Cautela, desde que estejam presentes, além dos requisitos genéricos de toda tutela cautelar ( e ), os seguintes fumus boni iuris periculum in mora requisitos específicos:
1- a moralidade administrativa restar gravemente violada;
2- tal providência extrema for comprovadamente o único meio capaz de impedir a perpetuação dos malfeitos;
3 - e quando manter o gestor no cargo, comprovadamente implicar na irreversibilidade dos efeitos nocivos das condutas improbas.
Esses requisitos, ora elencados como específicos, buscam compatibilizar a redação da LIA e a solução usualmente empregada pela jurisprudência, que de certa forma adotam posturas restritivas em relação ao tema, com a necessidade de se fazer valer a norma que se extrai do texto da Carta Magna. Repita-se: a Constituição é o fundamento de validade da própria Lei de Improbidade, devendo-se, pois, interpretar este diploma à luz daquele – e não o inverso.
Se permitir o afastamento no curso de ação de improbidade, com base exclusivamente nos requisitos genéricos da tutela cautelar seria temerário, pois teria (em tese) o potencial de gerar o desrespeito à soberania popular exteriorizada pelo voto, não permitir o afastamento quando os mesmos requisitos estiverem robustecidos pelos requisitos específicos, agora trazidos à colação (extraídos de uma interpretação sistemática da Lei Maior), macularia de morte a Carta Magna, notadamente o de seu caput art. 37 – o que não se pode aceitar.
No caso dos autos todos esses requisitos (genéricos e específicos) estão amplamente demonstrados, conforme a extensa fundamentação supra. Por esses motivos, com arrimo nos artigos 12 da Lei de Ação Civil Pública e 297 do Código de Processo Civil, o gestor deve ser afastado do cargo por este juízo, nos termos requeridos pelo Ministério Público.
Diante do exposto, ACOLHO o pedido do Ministério Público e DETERMINO o afastamento temporário do Sr. Prefeito Municipal de Catende, Josibias Darcy de Castro Cavalcanti, pelo prazo de 180 dias (prazo no qual a demanda será sentenciada), sem prejuízo de sua remuneração, devendo assumir o cargo o vice-prefeito eleito.
DETERMINO que o Senhor Oficial de Justiça, com a atuação nesta comarca, intime presidente da Câmara Municipal de Catende, para que adote as providências atinentes à substituição.
DETERMINO que o vice-prefeito seja intimado desta decisão.
DETERMINO que o Senhor Promotor de Justiça seja intimado desta decisão.
A cópia impressa desta decisão, assinada eletronicamente, valerá como mandado/ofício.
Cumpra-se com urgência.
CATENDE, 26 de setembro de 2019.
RICARDO GUIMARÃES LUIZ ENNES
Juiz(a) de Direito
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