MORTE DO ÍNDIO GALDINO, EM BRASÍLIA, COMPLETA 21 ANOS HOJE



Morte do índio Galdino, em Brasília, completa 21 anos hoje

Indígena foi queimado vivo em 20 de abril de 1997, por cinco jovens do Plano Piloto; ele visitava Brasília pela segunda vez


SP Sarah Peres - Especial para o Correiopostado em 20/04/2018 20:40 / atualizado em 20/04/2018 20:45






O cacique da tribo Pataxó Hã-hã-Hãe Galdino Jesus dos Santos foi morto em uma parada de ônibus em 21 de abril de 1997(foto: Sérgio Amaral/CB/D.A Press) A madrugada posterior à comemoração pelo Dia do Índio, em 19 de abril de 1997, chocou todo o Brasil. Por volta das 5h30 de domingo, à época, 20 de abril, cinco amigos deixavam o Centro Comercial Gilberto Salomão com um carro Monza preto, após uma noitada. Na parada de ônibus da 703 Sul, estacionaram o veículo para "brincar". No local, dormia o cacique da tribo Pataxó Hã-hã-Hãe Galdino Jesus dos Santos, 44 anos. 


O quinteto, que morava no Plano Piloto, era formado por Antônio Novely Vilanova, na época com 19 anos, Max Rogério Alves, 19, Tomás Oliveira de Almeida, 19, Eron Chaves Oliveira, 18 e G.A.J., 17, estava munido com álcool e fósforos. Eles utilizaram o material para queimar vivo o indígena, que visitava Brasília pela segunda vez. 




Galdino havia chegado na capital ainda naquele sábado, juntamente com outros oito índios da tribo oriunda do Sul da Bahia. Após comemorarem a data com protestos, o cacique deixou a festa por volta de 0h e se direcionou até a pensão onde estava hospedado, a 200 metros do ponto de ônibus onde ocorreu a tragédia. Perdido, chegou ao local às 3h, contudo, não pôde entrar. "A dona da pensão o barrou na e disse que já passavam das 21h — hora em que as portas normalmente se fecham", relatou um primo do cacique ao Correio, à época. 


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O índio descansou por duas horas, até que a barbárie ocorreu. Após a o ato violento, os amigos fugiram no veículo, mas foram seguidos por uma testemunha que passava pelo local e anotou a placa. Enquanto isso, Galdino recebia ajuda de outras pessoas, que tentavam apagar as chamas com água e com um extintor de incêndio. 


Pessoas próximas ao túmulo do índio pataxó Galdino Jesus dos Santos, na aldeia Pataxó, na Bahia(foto: Ronaldo de Oliveira/CB/D.A Press) 


O cacique foi transportado debilitado e, após laudo médico, constatou-se que ele teve 95% do corpo consumido por queimaduras de 2º e 3º grau. Depois de um dia de luta, o índio não resistiu e morreu no Hospital Regional da Asa Norte (Hran). Na segunda-feira seguinte, 22 de abril de 1997, Galdino faleceu por insuficiência renal, provocada pela desidratação de seu corpo. O mau funcionamento dos rins afetou os demais órgãos. 


O sepultamento de Galdino ocorreu na cidade baiana de Pau-Brasil. No peito, o cacique carregou uma cruz vermelha, com a qual foi enterrado. Mesmo na hora do adeus, amigos da tribo não deixaram a revolta de lado. "Eles nos chamam de selvagens, mas são uns verdadeiros animais (sic), relatou ao Correio o cacique Wilson Pataxó, naquele ano de 1997. 



Monumento em homenagem ao cacique Galdino. Em 2008, índios da tribo Pataxó foram ao local para uma celebração religiosa(foto: Carlos Vieira/CB/D.A Press)


Memória viva
Para o cacique Junior Xukuru, gestor da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), articulador do Conselho Indígena do Distrito Federal e conselheiro do Conselho Nacional de Cultura Indígena do Brasil, o povo indígena ainda sofre com a lembrança de Galdino. "Nos revoltamos com a história do nosso irmão até hoje, pois vemos que a justiça não é para todos. Enxergamos isso quando sabemos que os bandidos que fizeram isso com o nosso irmão estão soltos. Mas esse ocorrido não matou a nossa história, fez parte dela e fez nascer a memória do Galdino, que permanecerá", salientou. 



À época, povos indígenas e manifestantes do Movimento Sem Terra (MST) se reuniram em protesto por justiça(foto: Paulo de Araújo/CB/D.A Press)
O agora
Em todo o país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010 — último censo elaborado —, 896 mil pessoas se declaram indígenas. Na capital federal, conforme a Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (2015), são 3 mil pessoas. Mesmo após 21 anos de um crime que abalou o Brasil, a população indígena continua sendo massacrada. 


De acordo com o último levantamento do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), de 2016, 56 indígenas foram assassinados. O Mato Grosso do Sul engloba o maior número: 15 vítimas do povo Guarani-Kaiowá. O Maranhão ocupa o segundo posto, com 11 mortos das tribos Guajajara e Gamela. Em Santa Catarina, o terceiro lugar: seis pessoas do povo Kaingang morreram. 


Para o secretário-adjunto do Cimi, Gilberto Vieira, há um crescimento da violência contra os povos indígenas. "Há uma intensificação dos conflitos entre indígenas e não-indígenas, que são comprovadas nos dados que levantamos. No Mato Grosso do Sul, a situação é a mais grave. Contudo, vemos que outros povos, como em Rondônia, por exemplo, também passam por problemas relacionados à posse de terras", elucidou. 


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Segundo o cacique Junior Xukuru, existe um massacre dos povos indígenas. "Ao longo dos anos, há um massacre da nossa luta pelos direitos que temos. Nos matam, simplesmente, por um pedaço de terra. Atualmente, não temos mais demarcações de terras que garantam o nosso plantio e sobrevivência, o que gera um grande problema dentro e fora das comunidades indígenas", opinou. 


A solução, de acordo com Gilberto Vieira, seria a demarcação de terras. "A única saída é ocorrer essa demarcação dos territórios indígenas, sobretudo onde existem conflitos violentos. Mas, para isso, é preciso ter respeito à população indígena que vive nessas regiões. Esse é o modo de cessar a violência", constata.

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